Mesmo dentro das minhas limitações de tempo (*são quase duas horas da manhã agora*), acho que preciso comentar algumas coisinhas sobre a Copa do Mundo. E queria deixar uns links de textos e vídeos com conteúdo interessante para quem passasse por aqui. Enfim, fui procurar e não encontrei nenhum post aqui no blog falando da Copa do Mundo. Tenho, sim, um post marcando minha posição em relação às Olimpíadas no Rio de Janeiro (*Rio 2016: É para Comemorar?*). Talvez, por nunca ter sido contra a Copa e por não ser assunto principal aqui do blog, não tenha me dado ao trabalho de escrever, mas vamos lá. Só começo lembrando que Lula não trouxe a Copa para o Brasil sozinho, que em 2007 havia muita gente apoiando. Políticos, empresários de vários ramos, celebridades, etc., fora, claro, a população que em sua maioria festejou a escolha da FIFA.
Nunca vi como algo prejudicial ao país que o Brasil sediasse uma nova Copa do Mundo de seu esporte favorito, o futebol (masculino). Seria, também, uma chance de vender o país – não suas mulheres e crianças para a prostituição– para o mundo, uma forma de gerar empregos, consolidar ainda mais o turismo, possibilitar a construção de obras que tornassem a nossa vida melhor. A politicagem prejudicou e muito o que se poderia lucrar com o turismo (*o excelente programa Sua Viagem da BandNews discutiu a questão várias vezes*), fora, claro, a ambição desmedida do setor hoteleiro. Eu imaginava que a Copa não seria tão elitista e não sabia o quão predatória a FIFA poderia ser. Desde muito achava essa história de 12 sedes uma loucura; colocar jogos 13h em Manaus, Brasília, Rio de Janeiro, uma desumanidade com os jogadores e outros profissionais envolvidos; fora o vai e volta desgastante de avião. E nem vou comentar o lixo que foi a abertura. Até agora estou tentando entender o que aqueles homens brócolis (*araucárias, na verdade*) tem a ver com a cultura brasileira...
Enfim, quando estive no Mato Grosso em 2012, comecei a me situar nas politicagens do Governo Lula em relação às sedes da Copa. Cuiabá não tinha estrutura para receber um evento desse porte, o aeroporto, por exemplo, nem fica na cidade e mais parecia uma pista de pouso mais elaborada, só que o governador a época era parceiro político do petista. Manaus não tem um time de futebol de expressão e, agora, tem um estádio que periga ficar sem uso. Já Belém, tem tradição no futebol – Remo e Paissandu – e uma estrutura de turismo muito elogiada. Mas a política ditou tudo. A FIFA determinou muita coisa (*assistam o vídeo abaixo*), mas nossos políticos tentaram lucrar ao máximo com as maracutaias dessa Copa. E algo a mais: 12 sedes é uma expressão da megalomania de Lula, afinal, precisávamos ter "a Copa das Copas".
Mais tarde, comecei a me inteirar da política higienista promovida especialmente no Rio de Janeiro. Comunidades antigas, algumas com várias décadas de existência, removidas para que as obras da Copa pudessem passar. Obras que nem sempre eram voltadas para o público em geral, mas para o favorecimento de empreendimentos privados. Famílias foram arrancadas de suas casas pela força policial, favelas foram ocupadas. Enquanto isso, a grande imprensa os pintando como um problema, desocupados, resistentes ao progresso, vândalos e criminosos até. Aqui, em Brasília, quando falavam de obstrutores das grandes obras, citavam as floriculturas que o governo do PT local queria tirar para um lugar sem estrutura. Nem água, diziam os donos das banquinhas, havia. Fora, claro, que era um lugar mais escondido, que poderia levar a falência gente que estava no negócio há vários anos. Aqui e ali, o governo federal se deixou instrumentalizar para que o espetáculo da FIFA pudesse passar.
E qual o ponto desse texto afinal? Continuo amando a Copa do Mundo e curtindo futebol, mas isso não me obriga a aplaudir e me negar a ver os negócios escusos que foram e estão sendo feitos entre a FIFA e os vários governos, sim, federal, estaduais e municipais. Me revolta, no entanto, como a questão está sendo usada eleitoralmente. Parece que só o PT apoiou a vinda da Copa e, claro, nesse momento, é em Dilma que estão batendo. E as pancadas vem dos mais diferentes lugares, fora aqueles que tem que morder e assoprar, como a Rede Globo, que lucra muito com a Copa, mas tem o compromisso de desalojar o PT do poder e precisa a todo custo culpar o Governo Federal, e somente ele, por qualquer atraso ou problema relacionado ao evento.
Foi lastimável ver a presidenta ser xingada por VIPs (*pagantes de ingressos de 900 e poucos reais e convidados*) xingarem a governante mandando-a “tomar no c*” após cantarem o hino nacional. Educação? Respeito? Sim, neste caso, eram as elites – econômicas e intelectuais – gritando obscenidades na frente de suas crianças, na frente do mundo inteiro. Depois, eles e elas vão cobrar respeito à moral e aos bons costumes, mas contra a presidenta tudo é permitido. Não arrastaram o estádio inteiro (*ainda bem!*), mas foram ovacionados nas redes sociais por muitas pessoas. Fora, claro, parte da grande imprensa que legitimou e superdimensionou vaias e xingamentos, enquanto criminalizava as manifestações do lado de fora (*os vândalos que "politizaram" o evento... sei... sei*) e demonizou grevistas e trabalhadores em geral por suas reivindicações.
Depois disso, ou durante, sei lá, choveram as ofensas misóginas contra a presidenta, afinal, elas sempre se fazem presentes nessa hora. “Sapatão”, “vaca”, “mal comida”, e outras coisas mais (*Aécio Neves apoiou as vaias contra essa mulher mau humorada e arrogante, mas, depois, mudou ligeiramente de idéia*). Ápice de uma cultura que celebra o estupro e a violência contra as mulheres. Quando escrevo isso, não defendo Dilma como figura política, ou o PT como partido, mas, como feminista, marco posição em relação aos discursos de ódio e violência contra todas nós. Toda mulher será chamada de “vadia” um dia e isso nada tem a ver com seu comportamento, mas com o simples fato de ser mulher. Em relação a esta discussão, recomendo o texto da Jarid, porque ele toca em todos os pontos necessários e vai até além.
Depois disso, ou durante, sei lá, choveram as ofensas misóginas contra a presidenta, afinal, elas sempre se fazem presentes nessa hora. “Sapatão”, “vaca”, “mal comida”, e outras coisas mais (*Aécio Neves apoiou as vaias contra essa mulher mau humorada e arrogante, mas, depois, mudou ligeiramente de idéia*). Ápice de uma cultura que celebra o estupro e a violência contra as mulheres. Quando escrevo isso, não defendo Dilma como figura política, ou o PT como partido, mas, como feminista, marco posição em relação aos discursos de ódio e violência contra todas nós. Toda mulher será chamada de “vadia” um dia e isso nada tem a ver com seu comportamento, mas com o simples fato de ser mulher. Em relação a esta discussão, recomendo o texto da Jarid, porque ele toca em todos os pontos necessários e vai até além.
Desagrada-me, também, não nego, a falta de civilidade, de educação. Vaiar em um evento como aquele já é complicado, mas é um protesto legítimo e muito diferente do espetáculo que aconteceu no Itaquerão anteontem, dos xingamentos que foram entoados. Podem me chamar de conservadora, mas não vejo como enriquecedor de um debate agressões chulas que só nos fazem lembrar o quanto nós, mulheres, somos vulneráveis à violência. E mais, como bem colocou Juca Kfouri, o mesmo público que xinga Dilma, nunca fez o mesmo com Maluf, eleito e reeleito por São Paulo. Por ser homem? Por não ser petista? E mais, como Florestan Fernandes bem colocou, onde estão os outros políticos que apoiaram a Copa? Lula, especialmente. E o governador do Estado de São Paulo? Sobrou uma mulher para receber as pedradas. Presidente é para essas coisas, também, mas a solidão de Dilma me deixa assustada. E, claro, se o Brasil perder a Copa...
De resto, deixo o link do texto da Hildegard Angel sobre o caso das vaias. Ela, claro, superestima Dilma, já eu escrevo isso como alguém que vê na presidenta uma figura muito limitada como política, pessoa pública. Angel esperava dela uma reação mais enérgica às vaias. Ela não tinha como reagir, estava só, era evidente o seu constrangimento, sua tristeza, seu cansaço até. Fiquei com pena. Muita mesmo, por tudo o que uma mulher-presidente poderia representar e como foi frágil este Governo Dilma. Mas não quero discutir neste texto como a criatura nem sempre responde bem ao que o criador, no caso Lula, esperava. Melhor deixar para lá.
Muitos, como o Sakamoto, escreveram que aquela torcida não era a real torcida brasileira, pode ser, concordo com o ponto, só que não houve interesse do Governo do PT em levar o povão aos estádios. Quem estava no Itaquerão – muitos convidados – era exatamente quem mais detesta o governo. E que não se enganem os governistas que querem separar os brasileiros entre POVOXELITE, assim, tudo no singular e bem arrumadinho, pois muitos dos que fazem coro com os xingamentos ao governo, são beneficiados por cotas, prouni e outros, e querem, sim, o acesso a este mundo das elites, seus privilégios. Na base, lamento informar, faltou qualquer formação cidadã, de valores fundamentais para que não se vissem como vencedores às suas próprias custas somente. Tornar alguém consumidor, mesmo que de um diploma universitário, não é tornar alguém um cidadão ou um ser humano generoso, crítico, solidário com o próximo. Pode ser que o tapete do PT já não seja puxado agora, mas temo que não vá demorar muito. E aí, vai-se fora a água suja com o bebê dentro.
Fecho, no entanto, ressaltando que as elites – no plural, porque tem várias origens e compartilham somente alguns valores – gostariam de confiscar o direito de voto dos mais pobres. Uma das minhas turmas no Colégio Militar de Brasília perguntou-me se eu era a favor do voto obrigatório. Disse que sim para espanto deles. A maioria queria o voto facultativo para que os que “não tem consciência política”, e citaram imediatamente os nordestinos (*genericamente, todos eles, pobres, remediados e ricos, são ignorantes da politica nacional e comensais do PT*) e moradores das periferias, não se sentissem estimulados a votar. Longe deles defenderem que eles e elas, os mais pobres, os que estão distantes do eixo Sul-Sudeste-Brasília, pudessem ter o direito ao voto, só acreditam que este direito deveria ser para gente “diferenciada”.
Esses meus alunos se sentem membros dessa elite que xinga Dilma nos estádios, se acham mais cultos, conscientes, educados, mas desrespeitam mínimas regras de cidadania e convívio social. Alguns deles fazem, sim, parte da elite econômica, mas a maioria, maioria mesmo, são esses pobres inundados de ódio contra o PT, que não viram governos anteriores, que são educados pelas redes sociais e pela Veja. Meninos e meninas de 16, 17, 18 anos, reacionários e saudosos de tempos que não viveram, ditaduras que não experimentaram.
Esses meus alunos se sentem membros dessa elite que xinga Dilma nos estádios, se acham mais cultos, conscientes, educados, mas desrespeitam mínimas regras de cidadania e convívio social. Alguns deles fazem, sim, parte da elite econômica, mas a maioria, maioria mesmo, são esses pobres inundados de ódio contra o PT, que não viram governos anteriores, que são educados pelas redes sociais e pela Veja. Meninos e meninas de 16, 17, 18 anos, reacionários e saudosos de tempos que não viveram, ditaduras que não experimentaram.
Infelizmente, não posso dizer que a culpa é da Globo e da Abril e do Facebook somente, a culpa é, também, do Governo do PT. Transformar alguém em consumidor, repito, não é transformar alguém em cidadão crítico. Infelizmente, Lula não entendeu isso e, talvez, os bons programas de governo sejam jogados fora. Mas vou dormir. Daqui a pouco, Júlia vai me requisitar novamente. E cada vez que algum incidente como esse acontece, temo pelo Brasil no qual essa criaturinha irá crescer.