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Comentando Turma da Mônica Jovem #94 e a polêmica envolvendo a roteirista Petra Leão

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Faz umas duas semana, mais ou menos, que a amiga Petra Leão, uma das roteiristas da revista Turma da Mônica Jovem (*e grande cosplayer*), foi assediada, ofendida e perseguida na internet.  Um grupo (*enorme*) de desocupados, quer dizer, pessoas preocupadas com a moral, os bons costumes conservadores e a doutrinação marxista feminista que, supostamente, a roteirista estava promovendo, decidiram deixar clara a sua posição.  Tudo isso, é preciso dizer, depois de serem convocadas por seu guru, um famoso filósofo, ou astrólogo, sei lá eu, da internet.  Esse último dado , aliás, só fui ter vários dias depois, mas recebi na minha conta do Twitter umas três ou quatro agressões que vinham direcionadas à Petra.  Sabe quando respondem uma pessoa e a outra que estava no papo vai junto?  Pois é, assim percebi que os envolvidos em questão, além de grosseiros e desinformados, eram, também, bolsominions.  A coisa ganhou tamanhas proporções que foi parar nos grandes jornais.

A confusão toda aconteceu por causa do nº94 da revista e como fazia tempo que não olhava nada de Turma da Mônica Jovem, e muito tempo quer dizer antes da Petra assumir, na edição nº9, decidi comprar a edição e comentá-la como um todo.   Afinal, não posso embarcar na mesma canoa furada dos críticos que pegam um quadro só, o do “meu corpo, minhas regras” e criam uma ficção de doutrinação comunista em cima disso.  A revista chegou aqui na banca perto de casa na semana passada, li enquanto minha filha estava no parquinho e, agora, tecerei meus comentários.  


A leitura é rápida, direta, simples.  Algo surpreendente, e que mostra que os responsáveis confiam no seu público e nas vendagens, é que há notas em determinados quadrinhos remetendo à edições anteriores, o que daria uma melhor compreensão do andamento da história.  Eu, por exemplo, só soube que a Mônica e o Cebolinha romperam, porque acompanho o Ask da Petra.  Comentei sobre isso em outro post, aliás.  (*A Petra também deu um depoimento para o Shoujo Café uma vez.*)  É importante ressaltar esse tipo de coisa, as tais notas, porque elas apontam que para além da história de cada edição, que é relativamente fechada em si mesma, existe uma trama maior, há a história e o desenvolvimento de cada personagem.  Isso é importante e valoriza a inteligência e fidelidade dos leitores e leitoras.

Foi lendo o Ask da Petra que eu compreendo a importância de TMJ para o seu público que é de adolescentes.  Imagino que entre 12 e 15 anos, com transbordamentos.  Isso quer dizer que eu não sou o público alvo de TMJ e ainda que pessoas adultas possam acompanhar a revista, gostar dela, amar as personagens e tramas, ela tem um público determinado e as histórias focam nele.  


Na capa podemos ver o recorte sugerido com um “aconselhável para maiores de 10 anos”.  Quem é mais jovem pode ler?  Certamente, não há nada demais, no entanto, as personagens são adolescentes e os problemas são típicos dessa faixa etária, somado ao ambiente urbano e classe média que é o das personagens da história.  Se eu ainda estivesse lecionando para o ensino fundamental, poderia saber se as meninas – sim, imagino que boa parte dos leitores sejam meninas – lêem TMJ em público, o que apontaria para o nível de estima que a série possui.  

No tempo que eu estava dando aula para a 7ª série (*8º ano*), as meninas liam WITCH e mangá, os meninos liam mangá, ainda que conhecessem elas e eles os personagens da DC e da Marvel, mas comics nunca vi com ninguém.  Uma amiga professora expressou solidariedade à Petra dizendo que seus alunos e alunas adoram TMJ.  Esta amiga é organizadora de mais de uma gibiteca escolar, a maioria em escolas públicas de Minas Gerais, ela sabe do que está falando.


Pois bem, do que se trata a edição de TMJ da discórdia?  Começamos com a turminha, mais o Do Contra (*doravante DC*), atual namorado da Mônica, saindo do cinema.  Trata-se de uma paródia de Guerra Civil, coisa comum no universo da Turma da Mônica.  Os personagens se dividem entre apoiar o Capitão Homérico ou o Armadura Dourada.  A Mônica, no entanto, parece irritadiça, intragável até, com todos.  A situação persiste por dias, até que é revelado que ela está sofrendo de enxaquecas constantes.  Qual será o problema?

Os exames mais detalhados não pontam nada, então, começam a investigar os dentes.  A marca da Mônica são os seus dentes incisivos protuberantes.  Ela ama seus dentes, mas começam as sugestões e insistências para que ela coloque aparelho.  A personagem resiste e, então, o Cebolinha, seguido pelo DC, decidem iniciar uma guerra.  O time Cebolinha insistindo para que a Mônica coloque aparelho; o time DC que ela “seja ela mesma” e resista.  A menina no meio, sendo bombardeada pela internet, celular, ao vivo e tudo mais.  Situação insuportável e, enfim, em uma explosão, ela usa o jargão feminista “Meu corpo, minhas regras”.  


Para os alucinados e alienados de internet, bastou olhar este quadro para que Petra – e somente ela, apesar do Cassaro assinar a edição – fosse acusada de estar fazendo apologia ao aborto.  Sim, vocês leram bem.  Houve até quem escrevesse para o Maurício de Sousa via Twitter exigindo a demissão da Petra.  O efeito manada lotou a caixa postal, Twitter, Facebook e outras redes sociais das quais ela participava de ofensas e acusações.  Um absoluto horror, fruto do obscurantismo que permeia a sociedade na qual vivemos hoje e assusta pela violência gratuita.

Voltando ao quadrinho, ele termina bem a discussão do aparelho, que é, de forma muito apropriada, situado como algo importante para a saúde bucal, mas, também, um modismo, algo que muitos meninos e meninas querem usar para compor um visual.  A história expõe e discute de forma muito adequada o quanto os adolescentes podem sofrer com a influência do grupo, com a necessidade de se sentirem amados e queridos, e como as ferramentas que temos hoje – celulares e computadores – se prestam a levar para o mundo virtual esse tipo de pressão.  


Para ler e sentir a história em toda a sua extensão, é preciso ser adolescente ou conseguir se colocar no lugar deles e delas.  Nesse sentido, a revista consegue ser bem sucedida.  De resto, a história fecha com a turminha se reunindo, aquela do tempo dos quadrinhos infantis, Mônica, Magali, Cebolinha e Cascão, em uma tarde só deles.  Eu nunca fui leitora assídua da Turma da Mônica original ou da versão Jovem, mas achei essa parte a mais legal da edição.  

Recomendo que você que me lê, antes de embarcar nessa conversa de que TMJ está discutindo aborto, lesse a revista.  De resto, todo e qualquer roteiro da Petra, ou do Cassaro, ou de outro/a redator/a da revista, passa por muitas mãos.  TMJ é uma marca registrada da maior empresa de quadrinhos do Brasil e a Maurício de Sousa Produções é conservadora e busca a massificação.  Alguns temas podem e são discutidos, mas bandeiras tidas como radicais não serão levantadas por eles de forma alguma.  Qualquer pessoa sã saberia disso, mas o Brasil hoje está produzindo aberrações como o “Escola Sem Partido” e muita gente acredita que a Guerra Fria não terminou.


A isso tudo, temos somado o machismo e a perseguição contra as mulheres, algo mais que evidente no caso, aliás.  Preciso desenhar?  Se alguma coisa cheira à feminismo então, é um salve-se quem puder!  Imagine como é radical que uma pessoa afirme que o corpo é seu e ninguém tem o direito de dizer o que você tem que fazer com ele?  Só pode estar falando de aborto, né?  É preciso que se proíba esse tipo de sugestão em uma revista para adolescentes e pré-adolescentes.  E se eles e elas começarem a querer pensar por eles mesmos?  Tristes tempos...

Só que há um ingrediente a mais, um desprezo pelo produto nacional.  E se ele vende bem, e TMJ vende muito bem, vamos ter um monte de gente usando as mesmas analogias elitistas que valem para o funk, sertanejo universitário, e outros gêneros populares.  Brasileiros/as não tem bom gosto, apreciam lixo.  Até li em um grupo “progressista” que TMJ objetifica e sexualiza as mulheres.  Sério, minha gente, eu li.


Enfim, há quem ame mangá e odeie comics; quem ame comics e odeie mangá; quem se ache a última pipoca do saquinho por só ler quadrinho europeu; e nesses grupos todos é possível encontrar mesmo pessoas muito “progressistas” dispostas a difamar e ridicularizar o que é produzido aqui.  E não estou dizendo que você tenha que comprar o que não quer, o que não lhe agrada.  Eu não vou virar leitora de TMJ, por exemplo, podem ter certeza, mas reconhecer o valor alheio, o esforço e o trabalho bem feito, faz bem, sabe? 

De resto, termino confessando que não gostei nada do que li e vi lá no início da série TMJ e que a edição nº5 me deu material para discutir gênero, e que desci o pau nesse número, a palestra está aí no final, a partir do slide 28. Agora, será que por ter lido umas cinco edições lá do começo da série eu sou capaz de reduzir tudo o que foi feito depois àquilo?  De forma alguma.  A começar pelo character design.  Eu tomei um susto com a diferença, especialmente, em relação à Magali, por exemplo.  


Enfim, é isso o que eu tenho a escrever.  Toda solidariedade à Petra Leão.  Continue seu bom trabalho, oferecendo o seu melhor em TMJ.  Seus leitores e leitoras merecem e reconhecem, já os trolls são típicos desse momento lamentável no qual vivemos.  Só que eles, também, irão passar.


P.S.1: A maioria das imagens vieram desse grupo do Facebook.
P.S.2: Se você não faz parte do bando de desocupados que não leu a revista e agrediu a Petra, o texto não está falando de você.  Agora, leia o texto e entenda que o problema não é gostar, ou não gostar de TMJ ou da condução da equipe de roteiristas atuais, isso, aliás, é mais que normal e saudável.  Agora, se você nem faz parte do público principal da revista, um conselho (*porque é de graça e pode ser dispensado sem problema*): seria bom repensar esse seu desejo de que as coisas aconteçam do jeito que você espera, porque, efetivamente, ninguém está escrevendo pensando em você, ou em mim aqui.
P.S.3: E para o moço bobo que tentou ser engraçadinho, porque o "textão" não teve comentários.  Garoto, esse blog tem 11 anos, ele não vive de comentários, ele vive do prazer e da necessidade de se expressar.  O carinho e reconhecimento, quando existe, não se computa em número de comentários, ainda mais do tipo do seu. E só um detalhe: eu publico o comentário que eu quero e acredito que convém ao Shoujo Café.  Entendeu?

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